terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Cubículo

Marta vivia em um apartamento cujas extremidades praticamente não tinham o direito de serem chamadas como tais. Um verdadeiro cubículo, dizia ela. Em momentos de puro nervosismo, Marta exclamava em fúria: CUBÍCULO! Porém, logo percebia que gritos jamais a tirariam de sua estreita realidade. Então suspirava calmamente, como se tentasse apalpar o alívio. E depois de aliviada, Marta pronunciava mais uma vez o polissílabo que havia encontrado para insultar seu lar de uma sílaba só. Porém desta vez dizia cubículo de um modo muito suave, o que de certa forma demonstrava que realmente não estava mais com os nervos à flor da pele. Ela dizia cubículo, mas o dizia sem obedecer as leis que havia aprendido na escola. Dizia-o com uma desobediência irônica. Marta dizia cubículo como uma sobresdrújula. Marta pronunciava cubículo como uma espanhola que aprende "brasileiro".

Marta costumava encher a casa de móveis, alguns sem utilidade e/ou funcionalidade alguma. Chamavam-na até de anormal, louca. Porém, Marta havia feito de sua casa um depósito, pois aprendera que uma casa cheia quando esvaziada, parecia ser bem maior do que realmente era. Marta apreciava alargar seus horizontes e criar eco onde não havia.

2 comentários:

  1. [...] Marta é o próprio cubículo, não mais que um cubículo. Está coberta por tralhas e mais tralhas, precisando de uma geral. Até que Marta limpe sua mente, o cubículo ainda estará apertado. [...]

    Gostei do curta-conto =)

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  2. Acho eu - e espero não estar equivocada - que o cubículo é a própria Marta: ela é um exemplo daquelas pessoas que estão extremamente insatisfeitas com o seu redor; quando, na verdade, a insatisfação é consigo mesma: com uma personalidade mal-alicerçada, com valores mal-construídos...
    * Jeff, gostei muito do seu estilo.

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