quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

Dois bilhetes cor-de-rosa



Caetano viu Chico pela primeira vez antes das festas de fim de ano. Mas, a princípio, nada passou apenas de uma inocente e talvez até casual troca de olhares entre passageiros de um transporte coletivo.
No novo ano, Caetano voltou a ver Chico, de novo sentado no assento da janela, dessa vez sem ninguém ao seu lado. Houve então nesse dia mais que um olhar, pelo menos foi essa a impressão de Caetano. Como num ato de bravura e coragem, logo que passou pela catraca, Caetano respirou fundo e se sentou ao lado de Chico. Porém, durante pouco mais de quarenta minutos, os dois permaneceram no mais completo silêncio.
O tempo passou e Caetano pensou que nunca mais teria a sorte de ver Chico novamente. Até que um dia, sem se dar conta e desviando de outros passageiros para chegar até o fundo do ônibus, Caetano se viu de repente diante de Chico, sentado dessa vez no assento do corredor e com uma desconhecida a lhe fazer “companhia”. Eles se olharam e, mais uma vez, não trocaram sequer uma palavra. Porém, Chico, ao selecionar as músicas que iria ouvir durante aquele trajeto, deixou, "possivelmente" de modo involuntário, que Caetano bisbilhotasse o seu gosto musical. Havia MPB, The Lumineers e até Katy Perry. Caetano então sorriu de alívio e, sobretudo, alegria.
No dia seguinte, o excesso de calor humano, daquele que só gera incômodo, não permitiu que Caetano ficasse próximo do seu mais novo objeto de admiração. Dessa vez, Caetano viu Chico desembarcar sem ter tido a chance de viver a adrenalina que é tentar descobrir se existe ou não correspondência numa paixão.
O outro dia também não foi agraciado pelas boas conspirações do universo. Contrário à manhã anterior, o ônibus estava vazio; havia inclusive assentos vagos, mas nenhum deles era ao lado de Chico. Naquele dia insistir em ficar perto dele pareceria muito estranho, um tanto persecutório. E sem alternativas favoráveis, Caetano apenas o divisou com olhos tristes e se encaminhou para os assentos vagos e distantes.
Os dois dias seguidos de azar, contudo, fizeram com que na quinta-feira uma nova oportunidade surgisse, como uma flor de ipê amarelo que brota, retardatária, bem no finzinho da estação. Caetano, mais uma vez, pode se sentar ao lado de Chico. Era agora ou nunca! E num ímpeto incomum de “agora”, Caetano abriu o livro que carregava em mãos e dele retirou um bilhete cor-de-rosa, no qual havia escrito, desde a última segunda-feira, “gostei da sua play list!”.
Chico leu o bilhete e pediu uma caneta a Caetano, que logo lhe ofereceu papel também, do mesmo com o qual havia escrito a sua mensagem impetuosa. Apesar do balouçar do coletivo, Chico escreveu rapidamente e, em seguida, devolveu a caneta e entregou sua resposta a Caetano, que não conseguia esconder o quanto estava ansioso e esperançoso. Com espantosa calma, Caetano desfez a dobra do pedaço de papel e o leu. Contudo, no bilhete de Chico estava escrito: “obrigado. você é gentil. já tenho namorado.”.
Após ter lido a mensagem de Chico, Caetano ainda o olhou outra vez, mas apenas para lhe dizer um falso “tudo bem!”, que foi correspondido com um suave e doce sorriso. Caetano até imaginou fitá-lo novamente e lhe dizer “mas namoros acabam...”. No entanto, o que Caetano fez foi aproveitar o livro ainda aberto e simular uma atenciosa leitura; na verdade, compartilhar seu recente sofrimento com os do também sofrido Werther.
O fim da aventura de Caetano não foi como ele esperava, embora ele tivesse se sentido muito bem por ter feito o que fez.  Sentia orgulho de si mesmo, satisfação. Caetano nunca pensara que levar um fora pudesse ser, de certa maneira, uma experiência agradável.

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